Páginas

sábado, 9 de junho de 2012

O tal dia dos namorados

Uma senhora gorda subia a rua iluminada pelas luzes alaranjadas dos postes. Era noite e ele gostava disso. As casas estavam a sua frente, uma se sobrepondo a outra. Quatro garotos, do outro lado da rua, conversavam sentados sobre a calçada. Ele estava
apoiado na amurada da laje que se projetava em frente à casa de sua tia, onde residiam ele, sua tia, as duas primas, o marido da tia e o filho deste. O rapaz encostado na laje ouvia as lufadas de vento que incidiam no fone de ouvido. O tum-tum- tururum tum-tum do grave da música martelava fundo. O vento era bom de sentir no pescoço e no abdômen nu. Em que pensava ele? Nas casas a frente, na música que ouvia, no vento bom que sentia... Talvez pensasse em nada. Quem o olhasse lá de baixo, encostado naquela murada da laje (a casa fora construída sobre um terreno acidentado, a laje era uma espécie de terraço; abaixo da laje havia uma garagem e no lado da garagem a escada que subia até a laje) também não saberia dizer.


Pensava sim, isso era identificável... Pensamentos têm cores, sabores, texturas. Aquele era vermelho, macio, áspero e espocava feito uma uva que a gente pensa estar madura, mas na verdade não está.  Ah sim! Aquele dia se aproximava, o tal dia dos namorados e ele estava só. Riam dele. Havia sim duas por quem alimentava algum tipo de afeto, mas eram apenas sentimentos dirigidos a pessoas. Por que ele não ia em frente? Faltava confiança? Coragem? Gostaria ele de estar só? Sei tanto quanto quem lê isto, isto é, não posso afirmar nada sobre os motivos... 

Sempre que chegava perto de uma delas se sentia bobo, abestalhado. Algo inexplicável vinha, uma espécie de inibição, algo bloqueava suas ações. Que bobo! Mas ele sempre tentava de novo. Talvez  algum dia conseguisse.  Ele contou a uma delas, com voz rouca, sobre seus sentimentos. Disse que gostava dela. Disse como gostava. Ela demorou, mas admitiu o mesmo por ele. Não se assustem, mas foi por telefone que falaram isso. Por telefone é fácil, mas ao vivo... Ao vivo não conseguia. Mas sempre tentava de novo e de novo. A repetição tinha sido em vão até aquele momento. Quem sabe na próxima? Acho que sim. Talvez ela o ajude. Tudo é possível. Espero que dê tudo certo com ele e ela. A música com grave de tum-tum-tururum tum-tum- tururum terminou. Agora ele ouvia uma melodia doce e melancólica, com instrumentos que começavam chorando, mas que no final sorriam... Uma música, talvez sua favorita. Ele gostava de músicas. Quem sabe na próxima? 
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...