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quinta-feira, 20 de março de 2014

Sobre sapatos velhos, cadarços e pés

Você lembra, lembra, daquele tempo, eu tinha estrelas nos olhos, um jeito de herói

Há alguém de quem gostei.
Ele media a distância entre a lua e a terra com os dedos, assim a lua parecia mais próxima, e, era assim que mediamos o nosso tempo juntos.
Eu vivia andando com o sapato folgado, os cadarços viviam desamarrando, sujando, enrolando no chão. O cadarço quase solto,quase livre, com nós folgados.
Então, teve uma noite, em que ele veio, desatou os nós folgados dos meu pés, não foram os nós dos sapatos, mas do caminhar. Só que assim, com o cadarços desamarrados, eu poderia tropeçar, cair, mancar... 


Eu pedi que ele amarrasse de novo, ele queria me derrubar, amarrando os dois cadarços juntos. Quando os pés estão amarrados um no outro, o corpo só se movimenta em direção ao chão, a tal de força da gravidade está sempre aí, a nos puxar. Por isso pedi a ele que amarrasse cada um em separado, ele veio, amarrou. Amarrou separado e apertou.
O pé não anda mais livre, o caminho segue apertado, o pé dói.
Eu só sei fazer laços folgados, não sei dar nó em sapato, sobretudo, se eles são meus.
Se enlaço ou dou nó, é sempre folgado, para que caminhar não seja nocivo.
Os pés vão sustentando a gente, a vida toda, eles dançam, eles querem ser livres...
Já tive bolhas, calos, feridas, unhas encravadas, tudo por causa do sapato. Tem sapato que no começo cria aquela bolha de estimação, aquele calo amigo, que dói parecendo até que vai falar. Mas depois que o sapato fica velho, vai ficando macio.
Por isso entendo que mesmo com as marcas de bolha, ele e vocês não queiram deixar o sapato velho de lado, pra calçar um novo. Sabe porque? O sapato que ele usa é velho. Eu quase fiquei de perguntar. porque tu não troca isso? Só que não tive coragem, porque eu tenho uma sandália, que só uso as vezes e em casa, muito antiga, ela nem inteira está. De vez em quando a uso. Então como posso pedir que ele pare de usar o outro, o sapato velho dele?
Mas que incomoda, incomoda.
Até que um dia eu encontre alguém que saiba enlaçar.
Depois ele já queria desamarrar os meus cadarços de novo. Ele confessou que a vontade dele era pegar meu sapato e sair dali correndo, ver o que eu faria, se ia ir correr em busca dele. Eu não o deixei fazer isso, disse apenas "Eu correria".

Gosto de ter alguém para amar-rar os meus pés.
Imagens de:
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